Rompimento de barragem causa comoção internacional e coloca Vale na mira da justiça
Centenas de familiares ainda aguardam, ansiosos, informações sobre parentes desaparecidos após rompimento da barragem na mina Córrego do Feijão, em Brumadinho. A tragédia aconteceu no dia 25 de janeiro e deixou, até este domingo (3/2) 121 mortos, dos quais 107 já foram identificados, além de 226 desaparecidos e 192 resgatados.
No total, 12 milhões de metros cúbicos de rejeito atingiram em poucos segundos a parte administrativa da empresa e comunidades próximas. Só o refeitório chegou a ser arrastado por cerca de 800 metros. Equipes do Corpo de Bombeiros, Polícia Militar, Defesa Civil atuam dia e noite no resgate dos corpos e na tentativa de encontrarem sobreviventes nas matas próximas ao local. São mais de 500 agentes que atuam por meio de 15 helicópteros, em terra e com o auxílio de cães farejadores.
Na cidade, o clima é de angústia e desespero, seja por quem perdeu tudo, ou por quem não tem notícias de parentes.
Antônia Ferreira dos Santos, de 59 anos, morava há 25 anos no bairro Parque da Cachoeira, um dos locais atingidos pela lama. Na hora do rompimento, anunciado aos gritos por uma vizinha, a única coisa que ela conseguiu pegar foi a bolsa com os documentos. No mais, restou-lhe apenas a roupa do corpo. Viu sua casa construída ao longo de uma vida ser varrida pela lama em poucos segundos.
“Minha casa era linda, de tijolos, murada, com portão. No quintal tinha muita fruta e meus animais. Levei uma vida para construir, sou muito batalhadora. Mas perdi tudo, não sobrou nada”, lamentou.
Segundo ela, há cerca de três meses a Vale realizou um treinamento com os moradores da região, dando orientações em um possível caso de rompimento de barragem. No entanto, segundo ela, na hora do ocorrido não houve nenhum sinal sonoro que alertasse os moradores. “Não tocou sirene, nem nada. Minha vizinha que passou gritando”, conta.
Já Maristela Ferreira Gomes aguarda, com expectativas, notícias do filho Everton Guilherme Ferreira Gomes, de 20 anos. Ele trabalha na empresa Progeo em Itabirito e na sexta-feira havia ido à mina do Córrego do Feijão para uma inspeção técnica. A última comunicação que a família teve com o jovem foi uma mensagem enviada para o celular do pai às 12h18. Depois, não houve mais notícias do rapaz.
“O coração está arrasado e a gente tenta buscar esperança em qualquer informação, porque é muito difícil. Quanto mais o tempo passa, mais vamos ficando agoniados”, disse.
Angústia
A todo momento, familiares chegam ao posto de atendimento da Vale, montada na Estação do Conhecimento, ao lado da UPA de Brumadinho, na tentativa de ter mais informações.
“A maior dificuldade é ter de lidar com a angústia dos desaparecidos. Podem ter certeza que estamos trabalhando como se essas pessoas fossem nossas mães e nossos pais”, disse o tenente Pedro Aihara, porta-voz do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, em coletiva na segunda-feira, dia 28.
“Como posso dizer que aprendemos com Mariana?”
Em coletiva na noite do acidente, o presidente da Vale, Fábio Schvartsman, já havia adiantado que o rompimento em Brumadinho teria um impacto humano maior do que o ambiental. Ele comparou o fato com a tragédia de Mariana, quando a barragem da Samarco se rompeu causando a morte de 19 pessoas e desastres ambientais nunca antes registrados no país.
“Como vou dizer que a gente aprendeu (após o acidente de Mariana) se acaba de acontecer um acidente desses? O que posso dizer foi o que a gente fez depois do acidente. Viramos todas as barragens do avesso e contratamos as melhores auditorias do mundo para verificar o estado de todas elas. Fizemos tudo que a gente entende que era possível para garantir a segurança e a estabilidade. O fato é que não sabemos o que aconteceu e o que ocasionou, mas certamente vamos descobrir”, afirmou.
Segundo ele, a barragem não era utilizada desde 2015 e já estava no processo de desativação. Schvartsman ainda disse que em, 26 de setembro de 2018, a estabilidade da barragem na mina Córrego do Feijão foi atestada em auditoria da empresa alemã Tüv Süd e que uma leitura dos monitores feita no último dia 10 não mostrou irregularidades.
Porém, dois engenheiros que atestaram a segurança da estrutura rompida e outros três funcionários da Vale foram presos no dia 29 de janeiro, durante operação conjunta do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal (PF). A ação investiga as causas do acidente e a suspeita dos órgãos é que o laudo tenha sido falsificado.
Em nota, a Vale informou que permanecerá contribuindo com as investigações para a apuração dos fatos.