Projeto que passa por Mário Campos, São Joaquim de Bicas, Igarapé e Mateus Leme pode tirar 5 mil carretas da estrada, mas traçado levanta debate socioambiental
Com investimento de R$ 1,5 bilhão, o projeto do Ramal Ferroviário Serra Azul promete revolucionar o escoamento mineral no país. O empreendimento da Cedro Participações envolve uma linha férrea de 26,5 km de extensão, entre Mateus Leme e Mário Campos, conectando a RMBH à malha da MRS Logística — que leva aos principais portos do sudeste. A estimativa da empresa é que as obras iniciem em 2027, com conclusão em 2030.
Além de facilitar a logística do escoamento de minério da região, o projeto promete tirar até 5 mil carretas da Rodovia Fernão Dias (BR-381), melhorando a segurança no trânsito e diminuindo as emissões de carbono. Entretanto, o atual traçado do projeto — que já conta com declaração de utilidade pública e autorização para desapropriações da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) — é alvo de debate e críticas devido aos impactos socioambientais do empreendimento.
Entre os principais fatores de risco apontados por políticos e comunidades locais é que parte significativa do traçado atravessa a Área de Proteção Ambiental (APA) de Igarapé. Esta APA é fundamental para a proteção do Reservatório Serra Azul, responsável pelo abastecimento hídrico de cerca de 16% da RMBH. Nese contexto, Igarapé recebeu, no último dia 11, um seminário para debater as questões socioambientais implicadas no projeto.

O PROJETO
O Ramal Ferroviário Serra Azul é considerado uma shortline (pequeno trecho ferroviário), de 26,5 km. A linha passará por quatro municípios: Mateus Leme, Igarapé, São Joaquim de Bicas e Mário Campos. O projeto é liderado pela Cedro Participações — holding brasileira com atuação em mineração, agronegócio, logística, real estate e saúde.
Lucas Kallas, fundador e presidente do Conselho Cedro Participações, entende que o projeto será um marco para a logística mineral do país, principalmente para a região sudeste. “O Ramal Ferroviário Serra Azul representa uma mudança de paradigma para toda a cadeia logística que conecta Minas Gerais ao litoral fluminense. A retirada de milhares de carretas por dia da Rodovia Fernão Dias será um marco para a mobilidade, para o meio ambiente e para a logística nacional.”
Para o projeto, serão necessários cinco pares de trens por dia, com 136 vagões e capacidade de 106 toneladas cada. Segundo a empresa, essa estrutura ferroviária ajudará a, no longo prazo, retirar de circulação até 5 mil carretas que trafegam diariamente pela Fernão Dias (BR-381), reduzindo a emissão de poluentes e a elevada ocorrência de acidentes e fatalidades verificados no trecho nos últimos anos.
Segundo Sistema de Estimativas Emissões de Gases (SEEG), o modal ferroviário pode emitir até 88% menos gases de efeito estufa por tonelada transportada quando comparada ao modal rodoviário. A implementação de ferrovias também age em um dos principais gargalos da logística brasileira, já que as rodovias recebem cerca de 65% do transporte de cargas do país, apontam números da Confederação Nacional do Transporte (CNT).
De acordo com a Cedro, o empreendimento deve gerar, ao longo de sua construção, cerca de 4 mil empregos diretos e indiretos, com previsão de entrega até 2030. Estão previstos R$ 1,5 bilhão em investimentos para o projeto.
DEBATE SOCIOAMBIENTAL
O traçado do projeto ainda não está definido. Mas, há um traçado provisório com a ANTT, que já autorizou a desapropriação dos terrenos necessários para a construção da ferrovia e declarou o empreendimento como utilidade pública — que acelera e isenta alguns procedimentos burocráticos. Entretanto, o projeto ainda não tem as licenças estaduais e vem levantando debates na região e também com figuras públicas estaduais e nacionais.
No último dia 11, Igarapé recebeu um seminário para discussão dos impactos socioambientais do projeto, proposto pela deputada federal Duda Salabert (PDT). O evento contou com a presença de comunidades impactadas pelo traçado, inclusive lideranças indígenas, além de autoridades locais e regionais, como a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT).
O seminário foi convocado relatando que o projeto passa por áreas densamente habitadas, protegidas e de importância estratégica para a segurança hídrica e ambiental. Em particular, a Área de Proteção Ambiental (APA) de Igarapé, importante para a proteção do Reservatório de Serra Azul, que abastece a Região Metropolitana de Belo Horizonte
O vereador de Igarapé Rafael Webert (PV), parlamentar que está encabeçando as lutas contra o projeto no município, entende que o impacto às nascentes da região será imensurável. “No seminário, discutimos sobre os impactos na região, das nascentes e leitos d’água que irão sumir caso o projeto avance, mostrando a nossa contrariedade a esse projeto. Entendemos que o impacto será imensurável.”
Webert destaca que as mobilizações e discussões estão sendo realizadas em diferentes âmbitos, visando barrar o projeto. “Ainda não tem um traçado oficial. O que tem é um esboço que está no na ANTT, mas ele já está com autorização da ANTT, a nível federal, e estão buscando liberação ambiental no estado. A nossa luta é para que não não haja essa liberação ambiental, porque seria um assassinato ao meio ambiente, que é o que a gente entende aqui devido à visita técnica que fizemos na região. Terão outra audiências, inclusive com o Ministério Público Federal”, disse o vereador.
Perguntado sobre o projeto Ramal Ferroviário Serra Azul, o secretário de Desenvolvimento Sustentável de Igarapé, Pedro Américo, alega que empreendimentos deste porte precisam de análises profundas e cuidadosas. “Qualquer projeto desse porte precisa ser analisado com profundidade, considerando todos os impactos que podem gerar para a população e para a cidade, além das consequências ambientais, especialmente na Área de Proteção Ambiental de Igarapé. É fundamental que a avaliação seja feita com base em estudos técnicos consistentes e no diálogo com a comunidade de todos municípios envolvidos.”
O QUE DIZ A EMPRESA
Questionada pela reportagem, a Cedro afirma que o projeto está seguindo todos os requisitos regulatórios para a regularização ambiental do empreendimento. “O projeto do ramal ferroviário Serra Azul encontra-se ainda em desenvolvimento, e a Cedro Participações está finalizando os estudos que subsidiarão a confecção do relatório de impacto ambiental (RIMA) do empreendimento a ser futuramente protocolado junto aos órgãos competentes. Dessa forma, o traçado da ferrovia ainda está em fase de definição. Importante ressaltar que desde o início dos estudos a companhia busca respeitar premissas para gerar o menor impacto e interferência em áreas urbanas ou de preservação.”
Ressaltou que a projeção do início das obras para 2027 já está atrelado aos marcos regulatórios e à discussão com a sociedade. “O início das obras está estimado para 2027, quando todos os requisitos regulatórios e legais, inerentes a qualquer projeto de infraestrutura, forem concluídos, o que inclui a ampla discussão e participação das comunidades e demais partes interessadas”, afirma a empresa.

